segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Histórias do Cotidiano (Olhar de forma diferente...)

Sabe quando você acorda já sabendo que o dia não vai ser fácil?!
Imagine ficar praticamente oito horas em uma clínica de olhos com uma lista interminável de exames para fazer e na loja, contas a pagar, cheques devolvidos de clientes, orçamentos, UFA, haja cabeça para tudo isso!

Adiei por muito tempo esta situação, agora não tenho saída, precisei ir.

Fiz o primeiro exame às 9h e ainda estava agitado, desci para tomar café na esquina da Rua São José. Estava um movimento intenso de pessoas e carros barulhentos, pedi um café com pão na chapa (é imbatível pela manhã), que só não foi melhor por causa do atendimento.

Não sei se o problema era comigo, mas me pareceu que a balconista estava de mal com a vida e achei que passava esta frieza para as pessoas que estavam ao redor do balcão. Engraçado é que parecia que ninguém notava ou não ligava para aquilo.

Tive a impressão que o caixa, o gerente, todos estavam com as mesmas caras fechadas, como se estivessem ali fazendo um favor, um clima pesado que muito me incomodou.

Quando trabalhava na Embratel, ia visitar clientes e passava sempre por ali, via essas mesmas pessoas e nunca tive essa percepção, talvez por estar sempre tão apressado e envolvido com os meus problemas, que não percebia este tipo de coisa, acho até que não percebia nada ao meu redor...

Ignorei, não ia deixar aquela situação piorar ainda mais o meu dia, estava ali esperando o tempo passar para fazer o outro exame às 10h.

Relaxei e entre um gole e outro de café, comecei observar as pessoas que passavam por ali, afinal, naquele momento não tinha outra saída, precisava aguardar o tempo passar e voltar para a “bendita” clínica.

Incrível, eu comecei a me sentir como um ser de outro mundo que acabou de chegar e observava as pessoas de longe, como se elas fossem diferentes de mim.

Olhava para cada uma delas e parecia que estava lendo seus pensamentos através de seus gestos e semblantes. Elas me passavam emoção, felicidade e a grande maioria preocupação.

Comecei então a perceber árvores, como um ipê rosa, um ninho de pássaros e o olhar das pessoas.

Camelôs vendendo objetos interessantes, flores e tantas outras coisas que sempre estiveram ali e eu nunca havia percebido.

Naquele momento, havia esquecido dos problemas, saí de mim e olhei ao meu redor, não só com os olhos, mas também com o coração.
Percebi que a minha sensibilidade estava mais aguçada, o que permitiu por alguns momentos olhar aquele lugar de outra forma, de um outro ângulo. Tive uma sensação agradável e pude em silêncio solicitar a Deus pedidos de ajuda àqueles que pareciam preocupados e tristes, e um breve sorriso para aqueles que passavam felizes e de bem com a vida.

Me senti mais leve, mais feliz e revitalizado para encarar as incertezas e os problemas comuns da vida...

Naquele momento, despedi-me com um sorriso para a balconista, que agora já não me parecia tão “chata”!

Sidney

05/10/05

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Histórias do Casarão (O susto)



Hoje ao me levantar da cama, ainda sonolento, levei um susto ao pisar em um objeto no chão que fez um barulho parecido com brinquedo de corda. Imediatamente veio a lembrança de um momento muito engraçado ocorrido lá no casarão de São Cristóvão.

...Era um belo dia de Domingo e a família estava toda reunida, para mais um daqueles churrascos.

Aquele povo todo ao redor da churrasqueira conversando, era muito divertido!

Logo que cheguei notei o meu Pai diferente, muito sério e aparentando estar chateado, perguntei a ele o que estava acontecendo e ele respondeu muito rápido como se já estivesse esperando aquela pergunta:

_... Sua mãe me aprontou uma ontem, eu cheguei tarde, você sabe como é... Fiquei jogando sueca e acabei perdendo a hora!

_... O que ela fez?

_... Vou te contar, comecei a abrir a porta bem devagar e de repente um “diacho” de um carrinho de corda das crianças, estava encostado, de propósito, foi a sua mãe que colocou lá para fazer barulho e me flagrar!

_... E aí, o que aconteceu?

_... O carrinho começou a rodar e apitar, quase cai no chão até eu achar o interruptor de luz e entender o que estava acontecendo, você não pode imaginar como fiquei!

_... Há! Há! Há! Essa foi boa!

_ ... É né, é porque não foi com você! Mas, se fosse só isso não estaria tão p... da vida como estou!

_ ... O que mais ela fez?

_ ... Filho, você sabe que não sou mais nenhum garotão!

_ ... Sim, mas porque você esta falando isso?

_... Eu devia ter desconfiado, com todo aquele barulho tua mãe não ter se levantado e me dado uma bronca... O pior é que, o idiota aqui, achou que ela estava dormindo, me dei mal!

_... Pô pai, conta logo o que houve!

_... Eu tirei os sapatos e comecei a subir a escada com eles na mão, bem de vagar, para não fazer mais barulho e quando cheguei lá em cima...Você não vai acreditar!

_... Fala logo, pai!

_... Ela pulou na minha frente com uma capa de chuva e uma máscara de carnaval de macaco... Dei um pulo tão grande que não sei como não rolei pela escada, joguei os sapatos para o alto e cai sentado no chão, acho que até agora o meu coração esta acelerado, pô filho, isso não se faz, né!?

_... Há! Há! Há! Eu posso imaginar a sua cara, Há! Há!!!!

_... Não brinca não, essa mania de tua mãe assustar os outros ainda vai acabar mal, não é a primeira vez que ela faz isso, eu até acho graça, mas dessa vez... Foi demais!

_... Pai, ela só quis te dar um castigo!

_... Que castigo, ela quase me matou c......, e o pior é que ela ficou sentada no chão se escangalhando de rir e eu lá paralisado sentado na escada, poderia ter tido um infarto, p..., isso não é brincadeira!!!

_... Vamos lá, fica calmo, não vai estragar o dia...

Sai de mansinho de perto dele e fui para a cozinha falar com a mamãe, quando cheguei e olhei para ela, se escangalhou de rir, não demorou muito, estava aquela gente toda na cozinha rindo de dar dor de barriga com a mamãe contando o grito que ele deu e os palavrões pronunciados sentado lá no chão...
Ficamos imaginando aquela cena foi muito difícil controlar o riso, “caraca”!

Ela ainda o provocou falando alto:

_... Toda vez que você chegar tarde você vai se ver comigo!!!

Meu pai não era fácil, minha mãe naquele dia mudou a estratégia, em vez de brigar, deu um p...susto nele!

Que dia, ainda bem que ele se acalmou e acabou rindo também da situação.

Ai, começou o tal jogo de sueca, a “velha” confusão, meu pai me chamou:

_... Sidney, vamos jogar falta um?

_... Tô fora, por hoje chega!!!

Mamãe, ainda com aquele sorriso maroto nos lábios, me beijou e fui embora...

Passei alguns dias me lembrando daquilo, “caramba” contando ninguém acredita...



Sidney Paternoster Esteves
28/07/09

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Histórias do Casarão (Quanto vale esta casa?)


Naquela tarde de sábado, recebi o corretor de imóveis para fazer a avaliação da casa dos meus pais.Estava muito inseguro quanto ao valor do imóvel e cheguei até a dizer para ele quanto estava pretendendo obter.Aquela situação não era nada fácil para mim...

_ ... É uma casa muito boa, é clara, arejada, também com o “pé direito” desse tamanho! Escada de madeira maciça, muito bonita, este bar em baixo da escada ficou ótimo!

Lembro-me quando Papai comprou a casa e nos levou para conhecê-la. Os olhos dele brilhavam, estava muito feliz, mais do que a minha mãe, e só falava do espaço, do tamanho dos cômodos, do quintal com árvores frutíferas...
Quando chegamos ficamos assustados, afinal, morávamos em um apartamento na zona sul com apenas um quarto e de repente fomos parar na zona norte, naquele casarão de dois andares com vários cômodos que lembrava aquelas casas antigas mal assombradas.
Na sala e saleta havia aqueles lustres antigos de madeira, as paredes estavam manchadas e precisando de pintura, os quartos grandes e com imensas varandas. O banheiro era enorme, tinha aquela banheira antiga esmaltada e espaço de sobra para colocar muitas coisas, o quintal imenso cheio de mato onde podíamos ver nos fundos uma casa mal conservada com um jirau onde continha quinquilharias como caixas com azulejos antigos, peças de máquinas, enxadas e picareta. Soube que no passado era a casa dos empregados.
Sabe de uma coisa, naquela época nos divertimos muito naquela bagunça...

_... Puxa que cozinha grande, tem dispensa também, banheiro muito bom!

Eu me lembro do primeiro dia em que ficamos na casa. Como poderia esquecer...
Era um dia chuvoso e estávamos todos na saleta assistindo televisão. Eu, meus irmãos, meus pais, e um amigo de meu irmão chamado Alfredo ou Alfredinho...
Assistíamos a um filme de suspense e o clima era de tensão. Com toda aquela chuva e vento o basculante da saleta batia levemente criando um clima ASSUSTADOR...

Na verdade, ninguém se atrevia aa subir aquela escada para dormir sozinho...

Meu Pai parecia calmo e feliz com tudo aquilo, a minha Mãe estava um pouco assustada, imaginem eu e as crianças!

De repente uma coincidência daquelas, em uma cena na televisão escuta-se um grito, juntou com um forte vento que derrubou o basculante e o Alfredinho deu aquele grito de TERROR...

Não ficou um na saleta! Foi terrível ter que sair todos pela mesma porta... Até o meu Pai correu gritando e xingando, “pô, vai gritar assim na p...!”, nunca vi meu Pai tão assustado...
Depois rimos um bocado...

Jamais esquecerei este dia, acho que nenhum de nós...

_... O quintal é muito bom tem árvores frutíferas, churrasqueira, piscina... bem...

Lembro-me que colhemos muitas mangas e goiabas, os garotos da vizinhança viviam tocando a campainha e ás vezes chegava a irritar de tanto que pediam aos meus pais as mangas que ficavam no chão. Meus pais enchiam sacolas e mais sacolas e dava para eles, no fundo acho que eles gostavam de dar aquelas mangas para as pessoas porque elas saiam felizes e sorridentes.

Houve também a “caça aos ratos”, eram muitos no quintal, todos de mobilizaram. Meu Pai fez de tudo para eliminá-los: contratou empresas, colocou fumaça, até que alguém deu uma idéia, “coloque alguns gatos”!. Não é que deu certo! Chegamos a ter vários gatos com nomes muito interessantes: “garçom”, ”vasquinho”, “pé de pano” e “fifi”.

O dia da inauguração da piscina e da churrasqueira foi inesquecível. Compareceram colegas, parentes e até vizinhos...

Na verdade, aquela churrasqueira e piscina, foram motivo de muitas festas, casamentos e aniversários onde a família e amigos se reuniram. Sem falar do Natal e Carnaval. Mas teve uma que foi inesquecível talvez a mais animada, a festa junina.

Meu Pai um dia cismou de fazer uma festa. Ninguém acreditava que ia dar certo e acabou dando. Teve de tudo, fogueira, pescaria, casamento na roça, fiz até o papel de padre, essa foi inesquecível...

_... Seu Sidney, o senhor esta me escutando?

_... Ah, sim, desculpe-me!

_... Como eu ia dizendo, a casa é muito boa, porém a localidade não ajuda, infelizmente o valor está bem abaixo de suas expectativas. Fica em torno de,vamos ver...

O tempo passou, todos cresceram e você meu querido Pai se foi...

Ouça Pai, onde quer que você esteja, essa casa não tem sentido sem você, foi o seu “sonho” ou melhor, o seu “castelo dos sonhos” onde você reinava com grande bravura...

Todas aquelas tardes quando voltávamos do estádio de futebol, os gritos, as brigas, as piadas, os jogos de cartas que nunca gostei de participar por causa da confusão...

Sinto, muita saudade... De tudo...

_... Bem, seu Sidney, eu vou tentar um preço melhor e voltaremos a falar na segunda-feira para definirmos quanto vale esta casa, ok!? Um grande abraço e... não desanime, hein!?

_... Tudo bem! Obrigado, até lá...

Sidney Paternoster Esteves
Dezembro 2002

Conto publicado nos livros : Novos Talentos do Conto Brasileiro e Panorama Literário de Contos (Melhores contos publicados em 2009), pela Câmara Brasileira de Jovens Escritores.

sexta-feira, 13 de março de 2009

Histórias do Cotidiano (Ilha Grande)



Há muito tempo não retornava à Ilha Grande (Angra dos Reis).

A última vez foi com o pessoal da Embratel quando organizaram um passeio de fim-de-semana do qual nunca esqueci...

Pegamos (eu e Mônica, minha linda mulher) a barca em Mangaratiba e ali começou a nossa semana no paraíso!

Logo que avistei a praia de Abraão rodeada pelo verde da mata, com aquelas traineiras, veleiros e pequenos barcos ancorados, o meu coração disparou, ficamos rindo à toa, felizes com a nossa escolha, Ilha Grande, a visão dos deuses!

No desembarque já nos aguardavam a Naira e a Roberta da Pousada “Recanto das Flores”, indicada pelo meu grande amigo Cruz.

Simples, limpíssima e acolhedora, a pousada fica próxima da praia de Abraão e foi uma grande surpresa o carinho com que fomos recebidos a começar pela dona Conceição, mãe de Naira, uma senhora de 82 anos com uma lucidez incrível e um humor contagiante, que nos fez rir muito contando piadas, fatos curiosos de hóspedes estrangeiros e histórias locais.

Não podemos esquecer da cadela Ananda já com 12 anos, só falta falar, e do gato Leleco, albino (usa protetor solar nas orelhas), todos vivendo muito felizes e tranquilos.

Aliás, na ilha os animais são muito sociáveis, esquilos passam perto da gente com amêndoas na boca não estão nem aí para você, os passarinhos, em uma pensão que fomos, iam comer na mesa migalhas de pão e de arroz.

Mas os mais incríveis são mesmo os cachorros. Encontramos alguns na praia de barriga para cima como se estivessem apanhando sol. Toda trilha que nós íamos sempre tinha um nos acompanhando, passavam tranquilos entre o pessoal que caminhava, paravam para dar passagem, só faltavam dar “bom dia” e perguntar como nós estávamos.

Até me fez lembrar quando estive aqui na ilha com o pessoal da Embratel.

Um de nossos amigos, o Serginho. Ele sempre era o último a chegar, mas naquele dia, não apareceu, não me lembro o motivo, ficamos tristes por ele não ter ido.

Aí, em uma de nossas caminhadas pela ilha, um cachorro vira-latas cor caramelo, olhos claros começou a nos acompanhar por todos os cantos até que o Cruz (não podia deixar de ser) com o seu humor inteligente e peculiar, começou a chamar o cãozinho de Serginho, eu só sei que pegou, e ele passou a nos acompanhar nas caminhadas e pasmem: atendia pelo nome “Serginho”. Demos muitas risadas pelo caminho.

As trilhas são fantásticas, o cheiro da mata é indescritível, dependendo do lugar, ou melhor, da trilha que você está, você sente o cheiro mais acentuado do eucalipto ou de frutas como jaca e abricó. A biodiversidade é incrível, vi pássaros; árvores centenárias, como a castanheira com um caule que, para abraçá-la, é preciso uns cinco homens de mãos dadas, com aqueles cipós e raízes imensas se entrelaçando na superfície e atravessando a trilha; plantas; fungos; cogumelos e insetos diferentes do que estou acostumado a ver e em lugares atípicos, como o cacto que vi na pedra com sol escaldante.

Curtimos muito essas trilhas fazendo caminhadas, passamos pelo aqueduto construído em 1893, viajamos de traineira, fomos a Lopez Mendes (considerada, segundo pesquisas, a 3ª praia mais bonita do mundo) porém, a mais emocionante até pelo estado da trilha (havia chovido na noite anterior), foi na Cachoeira da Feiticeira, com a trilha seca dá aproximadamente uma hora de caminhada. Com ela molhada e barrenta, demoramos quase duas horas, escorregava demais, mas ao chegar lá e tomar aquele banho em baixo da cachoeira com aquela água fria, ficamos, como direi, totalmente enfeitiçados pelo lugar e nem lembramos do que passamos para chegar lá.
Tinha um pessoal fazendo "rapel", sinistro, deu vontade de fazer também só que não dava né!

A volta, bem... ninguém é de ferro, voltamos de “táxi boat”, pegamos logo abaixo, na praia da feiticeira. Foram 30 minutos maravilhosos com aquele mar esmeralda e a mata fechada, com as árvores balançando ao sabor do vento, a carícia da brisa em nossos rostos e um sol generoso prateando o mar de pequenas ondas...

Todos os dias à noite saíamos para passear, comer alguma coisa, olhar o artesanato local. Tem uma igrejinha (São Sebastião) na praça que é muito bonita, lembra realmente uma cidade do interior, ela fica aberta ao público para visitação, mas só tem missa uma ou duas vezes na semana e sua decoração é muito bonita. À noite, fica iluminada com uma luz azulada muito adequada para o local.

Uma dessas noites estava chovendo e nós resolvemos ficar na pousada batendo papo com o pessoal e aí tivemos a grata surpresa de conhecer o humor contagiante de dona Conceição. Depois de algumas piadas ela nos contou uma história de um nativo.

Na época do presídio, várias pessoas que viviam na ilha vendiam suas plantações de legumes e hortaliças (infelizmente hoje é proibido esta prática e isso prejudicou muito os nativos, pois acabaram com sua fonte de renda) e prestavam serviço de pedreiro, eletricista e outros para o local.

A partir de um certo mês, o pagamento foi através de cheque e um desses nativos nunca tinha preenchido um cheque antes. Ele, ao perguntar ao caixa do banco como retirava o dinheiro, foi orientado a preencher o valor desejado e ele preencheu no cheque “EU QUERO TUDO”, até hoje o pessoal local zoa ele.

Outro fato curioso foi com um turista alemão. Dona Conceição estava sozinha e ao entrar na recepção da pousada e olhar para o lado, no chalé (cinco metros de distância), notou que o cara estava totalmente nu do lado de fora e de costas para ela, totalmente à vontade, como se aquilo fosse a coisa mais natural do mundo (na Alemanha talvez...) eu me lembro do comentário de dona conceição:

- Eu, quando olhei e vi aquele homem nu de costas para mim, com aquela bunda branca, fiquei sem saber o que fazer, eu não falo alemão!


- E aí dona Conceição, como a senhora resolveu essa situação?


- Eu fiz “psit” e quando ele se virou, nossa senhora!


- O que aconteceu?


- Nada não, eu comecei a mostrar a minha blusa, sacudindo ela, tentando falar com ele para colocar a roupa, mas ele não entendia nada, ficava rindo, achando graça de não sei o que...


- Mas, o que a senhora fez?


- Nessas horas só tem uma saída, peguei a vassoura e balancei para ele!


- E ele?


- Acho que ele entendeu, correu igual um coelho assustado para a toca!


Como foi bom aquele papinho, as piadinhas, o “o que é o que é”, nessa, as duas, mãe e filha, conhecem muitas.

O ruim foi ter que ir embora, deixar tudo aquilo para trás, mas outro dia eu volto para conhecer o outro lado da ilha. O difícil vai ser acompanhar a dona Conceição na caminhada que ela faz junto com a filha todo ano ao redor da ilha, que dura aproximadamente cinco dias (detalhes com o meu amigo Cruz), “caraca”, é inacreditável. Bem, eu vou estar mais preparado, afinal de contas, acreditem, eu estou parando de fumar.

Fumando eu corro 8 km em 30 minutos. Se eu parar de fumar tenho que correr 8 km em 20 minutos pelo menos, caso contrário vou rever tudo... He..He..He.... calma galera... é brincadeira, 25 minutos tá bom!

Sidney Paternoster Esteves.

Maricá, 02/03/2009.

quinta-feira, 12 de março de 2009

Histórias do Cotidiano (Batman)

Sempre achei muito legal acampar. Embora não tenha participado de muitos acampamentos, me encantava ver todas aquelas barracas e trailers. As pessoas conversando animadamente, crianças correndo, bicicletas, paqueras da garotada. Toda aquela cumplicidade para se divertirem, passar um fim de semana com a família, rever os amigos e apreciar a natureza.

No Recreio dos Bandeirantes (Rio de Janeiro), tem um Camping na praia da Macumba. É uma exuberância toda aquela natureza, os animais, como micos, diversas espécies de pássaros e, é claro, aquele “marzão” que mexe com a nossa imaginação. Sem falar dos quiosques para beber uma água de coco após uma caminhada e também uma cervejinha bem gelada.

O meu sogro apreciava muito acampar com a família e sempre foi um cara muito querido nesse lugar.

Há algum tempo atrás, ele estava em sua barraca conversando pelo rádio amador (um hobby na época) e quando acabou de falar, percebeu um menino aparentando quatro anos, de bochechas rosadas e um olhar curioso que se aproximou dele e perguntou:

- Moço, porque o Sr. fica falando ai nesse negócio o tempo todo?

Ele, que sempre gostou muito de crianças, resolveu brincar com o menino e iniciou uma conversa:

- Olha, eu vou te contar um segredo que você não pode contar para ninguém, você promete não contar?

- Prometo (ele encostou na boca os dois dedinhos indicadores cruzados e beijou).

- Bem, se é assim eu vou te contar... Eu sou o BATMAN!

- Você é o BATMAN?!

Ele ficou na ponta dos pés com as mãozinhas no rosto, os olhos esbugalhados, com aquela expressão de surpresa e ao mesmo tempo de alegria.

Continuou conversando com o menino:


- Psiu, fala baixo, ninguém pode saber, é um segredo, lembra?


Ele se aproximou do meu sogro e falou baixinho no ouvido dele:

- Tá bom... Cadê o Robin?

- O Robin não está aqui, você vai ficar no lugar dele, mas não fala para ninguém!

E assim o menino passou grande parte do dia de um lado para o outro da barraca falando com o meu sogro, olhar maroto e com aquele sorriso de cumplicidade, o pessoal ria muito de tudo aquilo. Na época a dupla (Batman e Robin) era muito popular e as crianças adoravam.

No dia seguinte na praia, estávamos conversando sentados na areia quando o menino se aproximou com um picolé na mão e o rostinho cheio de lágrimas dizendo para o meu sogro:

- BATMAN, dá uma “lambidinha” no meu picolé que o meu pai não quis comprar um para você!

Ele fazia “beicinho”, segurava o picolé com uma das mãos e a outra enxugava as lágrimas.

A inocência daquele menino, a decepção de não poder dar para o amigo Batman um picolé, “caraca” deu até vontade de chorar com ele.

O sogrão abaixou, com os olhos marejados, abraçou o menino e disse:

- Não chore, foi bom você não trazer o picolé. Eu estou gripado!

Logo sumiram as lágrimas e ele sorriu abraçando o meu sogro dizendo:

- A gente compra outro picolé amanhã, tá bom?!

É para derrubar qualquer um. Que situação... Não dava naquele momento para acabar a brincadeira e dizer que ele não era o Batman.

Só que não podíamos imaginar que essa pequena brincadeira chegaria a uma situação ainda mais constrangedora.

Ao anoitecer, o menino entrou correndo em nossa barraca chorando e gritando:

- BATMAN… BATMAN ... vai lá na nossa barraca que o meu pai está batendo na minha mãe!

Situação pior ainda. Não dava para se meter em briga de casal e o sogrão saiu com uma muito boa:

- Eu não posso ir lá porque se eu colocar a roupa do BATMAN todo mundo vai descobrir, mas eu tenho aquele amigo ali, o Sr. Mauricio (Gerente do Camping). Fala com ele, que ele vai lá resolver.

Lá foi ele, meu sogro acenou para o Maurício e fez um gesto para que ele ouvisse o menino.

Felizmente tudo foi resolvido pelo gerente do Camping, mas ficou uma lição, quando você brincar com uma criança não a subestime, pense no que você vai dizer para ela. A imaginação delas pode te surpreender.

Uma coisa é certa, o meu sogro não quer ouvir falar nem de longe a palavra BATMAN...também né?!

Sidney Paternoster Esteves

25/02/09

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Histórias do Cotidiano (Um dia diferente...)


Ontem foi um dia atribulado e um tanto incomum.

Além de ir ao médico e resolver alguns assuntos particulares, passei parte da tarde com o meu filho Marcelo, assisti junto com ele a um filme antigo de Alfred Hitchcock, (ele adora cinema), debatemos alguns aspectos do longa e saímos para um tarefa árdua: levar alguns equipamentos de som para uma possível troca por um outro aparelho, lá na rua da Conceição.

Ao chegar no local, percebi logo de cara que seria complicado a começar pelo estacionamento em frente da loja, era proibido.

Logo que estacionei, fui avisado que o guarda era invocado...

Falamos com a pessoa responsável da loja sobre o nosso objetivo e começamos a perceber a “embromação”...

Testaram os aparelhos e disseram que estavam com problema em um dos canais, etc e tal...

O que nós queríamos era trocar os três aparelhos por um. No final o cara queria de volta cem reais!
Fomos embora rapidinho, antes que o guarda invocado chegasse e complicasse ainda mais a situação.

No caminho de casa, ainda estávamos comentando o ocorrido e muito chateados com a perda de tempo, quando paramos em um sinal e se aproximou um rapaz vestido de palhaço, com aquele sorriso conhecido de todos nós. Gesticulando pediu licença e começou a falar rápido e com muita desenvoltura:

- Boa tarde! Desculpe-me abordá-los, estou aqui tentando alegrar as pessoas e notei que vocês estão um tanto chateados, faço parte de um grupo de teatro e estou arrecadando uma pequena contribuição em dinheiro, pode ser qualquer valor!

Ao lado tinha um senhor vendendo refrigerantes e água e que olhava com uma expressão indignada para o palhaço, se colocando a gritar de forma incansável como se quisesse não deixar o outro falar:

- Olha a água, é só um real!

Pude perceber que ele estava aguardando o resultado daquela investida do palhaço.

Quando coloquei a mão no bolso, o sinal abriu puxei um real e entreguei ao palhaço, que ainda fez chacota:

- Não vai te fazer falta?

Eu disse:

- Não, mas se for muito, me dá a metade!

Ele riu e agradeceu gesticulado e mostrando a nota de um real para o senhor dos refrigerantes.

Aquilo me chamou a atenção e pelo retrovisor pude perceber a indignação do senhor.
Imagino o que ele estava sentindo:

- Eu aqui neste sol, com este peso tentando vender minha mercadoria e esse palhaço “171”, ganha um real mole...

Não pude deixar de rir da situação que embora tenha sido cômica, foi ao mesmo tempo triste ver aquelas duas pessoas naquela situação tão difícil e até mesmo humilhante lutando para sobreviver.

Comentei com o meu filho, foram duas lições de vida que tivemos hoje:

- A primeira, você sempre encontrará em seu caminho pessoas em situações piores do que a sua.

- A segunda, jamais troque ou tente vender um aparelho usado em uma loja, ele nunca será avaliado como deve, ou melhor, nunca vai valer nada!

Sidney Paternoster Esteves
Rio, agosto de 2007.

Histórias do Cotidiano (Solto ou não o Curió?)



O dia está claro e uma leve brisa toca o Algodoeiro da Praia em frente à loja, movimentando os galhos com suas folhas generosamente grandes em forma de coração. Suas flores amarelas são finas e sedosas tendo no centro uma coloração vermelha onde surge um pêndulo carregado de pólen.

O curió, no poleiro da gaiola, canta baixinho e preguiçoso olhando para o horizonte...

Fico ao seu lado e começo a pensar no capricho da natureza. Se ele não tivesse um canto tão belo provavelmente não estaria ali preso.

Mas, posso mudar a vida dele, é só abrir a porta da gaiola e deixa-lo livre, a voar pelos campos onde ele decidiria aonde ir e ficar.Só tem um “porém”, criado em cativeiro, não saberia viver sozinho, não saberia procurar comida, se defender dos predadores naturais, procurar abrigo e pior ainda, estaria sujeito ao egoísmo e a cobiço humano, que destino...


Isso me faz sentir inseguro e chego a ter uma espécie de calafrio, uma certa sensação de irresponsabilidade, de medo e perda. Afinal de contas, ele está comigo há algum tempo e me acostumei a cuidar dele todas as manhãs, dando comida, água, brincando e ás vezes até me pego conversando com ele como se fosse uma pessoa, meu confessor, um amigo.

Será que estou sendo egoísta mantendo-o “prisioneiro” para ter o seu canto todo tempo alegrando a minha vida? Ao mesmo tempo penso na quantidade de animais aprisionados, servindo aos homens, nos espetáculos de circo, nos zoológicos, nas pesquisas científicas, em criadores particulares e fico mais confuso ainda com os meus sentimentos.

Aproximo-me mais da gaiola e me pergunto se não estaria sendo irresponsável com a vida dele. Eu tenho autorização para cria-lo. E daí? Não foi ele que me autorizou, não foi ele quem me pediu.

O tempo fez com que eu me apegasse a ele... Se fosse hoje não o teria adquirido. Sempre gostei do convívio com a natureza e com animais domésticos. Talvez, pela natureza dos gestos, a sinceridade dos carinhos, a lealdade ... não sei! Fico pensando, afinal, qual a diferença em criar um cão, um gato e um passarinho? Porque nos afeta tanto manter um passarinho na gaiola?

Já sei, eles tem asas e podem voar. É isso, esta é a diferença! Para nós humanos, voar sempre foi motivo de inveja, o homem sempre quis voar e não mediu esforços ao longo dos anos para conseguir seu intuito. Olhar aquele “bichinho” ali preso, sabendo que ele poderia estar lá no alto, voando e vendo o mundo de outra forma, como sempre quisemos ver.

Solto ou não solto o curió?

E o medo dele morrer... Será que ele vai ficar perdido nessa imensidão de mata?

É como se eu soltasse a minha cachorra e a gata da minha filha na rua, quanto tempo eles viveriam? Talvez fossem atropelados, mal tratados, ficariam com fome ou alguém da mesma forma que o curió, os prenderiam e os levariam para outro lar, para outra “prisão”. A gata poderia virar churrasco e a cachorra sabão.

Mudariam de “dono” ou virariam “objetos de troca”, quem sabe?

É curió, talvez a decisão de soltá-lo fique mais fácil com a seguinte pergunta: “O que é melhor, uma vida engaiolado e preso sem poder voar pela imensidão do céu ou o risco de viver apenas uma ou mais horas completamente liiiiiiiiiiivre?” Como eu gostaria que você falasse para me responder... Fala curió, o que você prefere, fale!!!!

De repente tudo fica claro em minha mente e o peso enorme saiu de dentro de mim...

... Vá meu querido curió, voe como você nunca voou em sua vida, aproveite cada minuto, sinta esta brisa em suas asas, o calor do sol, pouse em quantas árvores puder encontrar em seu caminho. O seu instinto irá te ajudar, voe, voe bem alto e mesmo que a vida dure algumas horas, alguns minutos, terá com certeza, meu amigo curió, valido a pena.

A liberdade não tem preço, sem ela não somos felizes, não somos NADA.


Sidney Paternoster Esteves
20/05/05

Conto publicado no livro “Antologia de Contos Fantásticos N° 17”
Pela Câmara Brasileira de Jovens Escritores.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Histórias de Botequim (Pic- assassina)



Em um desses sábados maravilhosos de verão resolvi ir para o Rio e sair um pouco de Maricá. Estava com saudade do chopp gelado no boteco Café e Bar Columbia ou bar do português (do meu amigo Adão) lá na Tijuca.

Vivi ali grandes momentos com o meu pai e meus irmãos, fiz grandes amizades e estava sentindo falta da “conversa fiada”.

Bem eclético, o boteco recebe vários tipos de pessoas, com variadas profissões, além, é claro dos aposentados, enfim, uma mistura muito boa que torna os assuntos os mais variados possíveis.

Fala-se de trabalho, notícias da semana, política, mas o assunto “quente” é o futebol, ainda mais que o Adáo é vascaíno e dos bons!

É benemérito, muito bem relacionado no Vasco e é claro, muito bom de papo.

Estava no meu segundo chopp quando chegou o "metrô", todos o chamam por este apelido ou de João.

Ele é aquele cara tranquilo, gosta de jogar uma bola no fim de semana, curte uma sauna no Club Municipal e só vive bem humorado, sorrindo para todos e o curioso é que mora em Vila Isabel, mas está sempre ali com a turma do botequim.

Estudei com ele no Pedro II, em Botafogo, e não o via há muito tempo.

Ele pediu uma cerveja e começamos a conversar sobre os velhos tempos, dos amigos da adolescência, até que ele me contou uma história que aconteceu com ele, daquelas “cabeludas” e inacreditáveis!

Tudo começou quando entrou um cara no botequim, virou para ele e disse:

- E aí “pic- assassina”?

Ele acenou com um sorriso "amarelo" e começou a contar a história:

- Pô Sidney, se eu te contar você não vai acreditar!

- Conta aí, já estou curioso!

- Conheci há um tempo atrás, a Jacira e vivia um relacionamento muito legal, ela era viúva, tinha uma filha que gostava muito de mim e de vez em quando, eu ficava na casa dela.

- Mas você não é casado?

- Sou, mas, sabe como é que é, essas coisas acontecem!

- Claro, e aí, o que aconteceu?

- Era uma sexta-feira e dormi no apartamento dela, de madrugada me despedi e fui embora...

- E sua mulher não te deu um desgaste?

- Não, no meu trabalho eu só vivo viajando e tenho um bom álibi.

- Ah, sim!

- Pois bem, logo pela manhã recebi uma ligação da filha dela dizendo que a mãe tinha falecido, teve um infarto fulminante, por pouco não aconteceu comigo lá.

- Que situação, João!

- Nem fala, o pior é que naquele momento eu jamais poderia imaginar que um dia viveria uma situação bem pior do que esta.

- Como assim?

- Semanas depois conheci a Ermengarda, uma coroa bonita, separada, com uma filha já adulta que lhe deu um netinho.

- Você é louco cara, se arrisca muito!

- É cara, dessa vez quase eu me dei mal, parece que foi castigo, dormi um sábado no apartamento dela e o pior é que naquele dia, ela estava menstruada, coisa que não acontecia há algum tempo, pois estava entrando na menopausa.

- E a sua mulher?

- Havia falado com a minha mulher que ia para São Paulo, foi a minha sorte!

- O que aconteceu?

- Acordei bem cedo e fui fazer café, levei um para ela na cama e quando fui acordá-la com um beijinho, senti que ela estava gelada igual uma pedra de mármore e constatei que ela estava morta, joguei o café para o alto e entrei em pânico!

- Eu não acredito!

- Pode acreditar, não sabia o que fazer naquela situação, fiquei andando de um lado para o outro e resolvi chamar a filha dela, liguei para ela e falei que precisava lhe falar com urgência, para ela vir o mais rápido possível na casa da mãe que eu estava aguardando. Ainda bem que era perto!

- Que situação!

- Eu até pensei, “vou embora e largo tudo aí”, mas depois pensei e vi que poderia dar alguma “zebra” e isto era a última coisa que eu queria naquele momento...

- Porque você não ligou para os bombeiros?

- Eu não conseguia raciocinar direito, fiquei esperando a Selma, filha dela, para combinarmos o que fazer.

- Tocou a campainha, pensei, era a Selma!

- E não era ela?

- Não, era a vizinha, dona Luiza, uma senhora de uns 80 anos mais ou menos e que tinha marcado de sair com ela para caminhar. A Ermengarda já havia falado dessa senhora, já estava com uma certa esclerose e era muito só, por isso de vez em quando saía com ela para fazer companhia.

- O que você falou?

- Mal abri a porta e a mulher já foi entrando e perguntando pela Ermengarda e eu disse que ela estava dormindo e que não estava passando bem, para ver se ela ia embora, né?!

- E aí?

- Ela nem ligou, foi para o quarto dizendo que ia ver como ela estava.

- Caraca...

- Só escutei um “berro” que deve ter acordado o prédio todo.

- O que você fez?

- Naquela hora eu só queria sumir, chorar, sei lá e a Selma que não chegava!

- Não demorou muito para encher a casa, chegou todo mundo junto, tinha porteiro, vizinhos, bombeiro e a polícia.

- E a Selma?

- Pois é, ela chegou em um péssimo momento.

- O que você falou para ela?

- Ela já chegou assustada com todo aquele movimento, olhou para mim, eu devia estar pálido e me perguntou, o que aconteceu, por que toda essa gente?

- Selma, acho que tem alguma coisa errada com a sua mãe!

- Porque você não entrou logo no assunto?

- Eu quis prepará-la, sabe aquela história “o gato subiu no telhado...”

- Pô João, não brinca!

- Eu estava perdido com todo aquele tumulto e continuei falando com ela:

- Eu sacudo e ela não acorda, acho que está morta!

- Morta, a minha mãe, o que você fez com ela?

- Pô Sidney, quando ela falou isso, as minhas pernas tremeram, nunca tive tanta saudade de minha casa e imaginei, “se minha mulher souber disso”, só faltava chegar algum repórter para “esmerdalhar” tudo.

- João é inacreditável! E o que você respondeu?

- Ué, que não havia feito nada, que havia dormido com a mãe dela e quando acordei pela manhã e fui dar um beijo nela, notei que ela estava fria, igual mármore!

- E ela como reagiu?

- Não deu nem tempo, sabe a dona Luiza? Aquela velha! Quando me lembro dá vontade de chutar o traseiro dela!

- Mas por quê? Coitada da mulher! Ela deve ter levado um grande “choque” ao ver a amiga morta estendida na cama.

- Sidney, ao ouvir a voz da Selma, filha da Ermengarda, ela correu para a moça e falou aos gritos:

- Selma, Sr. Delegado prenda este homem, eu sempre falei para a Ermengarda não confiar nele!

- Eu não acredito que essa mulher falou isso!

- Pois é, falou, e eu respondi que ela estava fora de si e que não sabia o que estava falando.

- E aí ela falou a seguinte besteira:

- Sr. Delegado, o senhor pode olhar lá no quarto que deve ter havido alguma briga, tem uma xícara de café quebrada no chão, café espalhado por todo canto além da cama estar com mancha de sangue.

- O que o delegado falou?

- Me perguntou o que eu tinha a dizer e eu disse:

- Sr. Delegado, o sangue que está na cama é da menstruação dela...

- Não tinha nem acabado de falar e a dona Luiza aos gritos falou:

- Mentira Sr.Delegado! Ela já estava na menopausa, este homem é mentiroso!

- Aí eu fiquei bravo, apontei para ela e falei:

- Se a senhora acha que estou mentindo, chame um médico para constatar e se a senhora quiser pode colocar o dedo e cheirar tá bom?! Quanto à xícara e o café no chão, quero te dizer que estava levando o café para ela na cama e quando vi que ela estava morta, levei um susto filho da p... e joguei aquela merda para cima. É isso aí seu delegado!

- João como você saiu dessa?

- Tive que ir para a delegacia prestar depoimento, ainda bem que o delegado era legal entendeu a minha situação e não conseguia disfarçar o sorriso. Ele escutou todo mundo, inclusive o médico que chegou no local e pôde adiantar que havia sido infarto fulminante, além é claro da Selma, que embora não aprovasse o relacionamento da mãe com um homem casado, tinha grande estima por mim.

- João, realmente é uma história incrível, vê se toma jeito agora!

- Sidney, eu vou parar com isso. Deus me deu outra chance e eu vou parar, eu preciso parar!

- Mas João, se “pintar” outra na “área”?

- Bem, tem uma condição!

- Qual?

- Peço um eletrocardiograma dela e se tiver problema de coração, pode ser a miss Brasil, tô fora!


Sidney Paternoster Esteves

Rio 17/01/08

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Histórias do Cotidiano (Um sorriso no caminho ...)



Sabe estas noites que você não consegue dormir direito pensando no que te espera no dia seguinte?!

Saí muito cedo de casa para concluir junto com a equipe, um projeto de um cliente.

Entre cálculos e recálculos, saí apressado levando comigo uma proposta que fecharia a minha meta no mês.

Era um cliente exigente e muito formal que não admitia atrasos.

Lá fui eu de terno e gravata com uma pasta contendo a minha realização.

Ao passar pela Rua Camerino, em frente ao colégio Pedro II, deparei com uma cena inusitada. Uma senhora suja, vestida em farrapos, de rosto bonito e ao seu lado uma moça igualmente vestida, com Síndrome de Down, aparentando aproximadamente 25 anos, retirando arroz cozido do bolso e comendo.

A senhora parecia ser a sua mãe, dirigiu-me um olhar que jamais esquecerei, um olhar de sofrimento, um olhar de apelo e de tristeza...

Olhei a hora e segui em frente com aquela imagem em minha mente, de repente parei. Foi como se alguém ou alguma coisa sussurrasse dentro de mim, em meus ouvidos VOLTE! VOLTE!

Voltei, fui a uma padaria comprei roscas, biscoitos e fui ao encontro daquelas duas mulheres que, sabe-se lá porque, estavam naquela situação.

Abaixei e entreguei as roscas e os biscoitos àquela senhora e à moça que ao apanhar a rosca, começou a cheirar e a comer com um olhar distante.

Foi aí que recebi um presente que guardarei para sempre em minha mente, um sorriso indescritível acompanhado de um olhar que brilhava de felicidade, de amor, de gratidão.
Um olhar mágico que me fez esquecer os meus problemas e repensar a vida.

Saí dali tranquilo e feliz por ter feito aquilo, por ter ouvido aquela voz que deve ter sido de um anjo, pedindo que eu voltasse...

Nesta altura, não conseguiria chegar na reunião na hora marcada para entregar o projeto junto com a proposta e por incrível que pareça, não me importei nem um pouco com aquilo.

Estava relaxado e com uma paz interior tão grande que ao entrar no escritório do cliente, começando pela secretária, todos diziam:

- Você está muito bem, parece muito feliz, que sorriso é este?

E eu estava mesmo, feliz, leve e solto.

Perguntei pelo diretor e recebi como informação que, contrariando o dia-a-dia, ele estava retido em um engarrafamento e estava atrasado, era inacreditável. Enfim, fechei o contrato e até hoje guardo a imagem daquelas pobres mulheres e principalmente, daquele sorriso puro e sincero que me fez repensar procedimentos e ter mais sensibilidade com tudo que acontece ao meu redor.

Um presente divino que até hoje guardo em minha mente e no meu coração.


Aprendi que não importa o que você está vivendo agora, não ignore os avisos que surgem a todo instante, não pense só em você. Quando você sentir alguma coisa diferente em você mesmo, quando ouvir alguma coisa dentro de si tentando te dizer algo, pare, pense, escute e olhe ao redor. Você pode estar escutando e/ou vendo a resposta que você precisa para aquele momento da sua vida.

O Universo conspira sempre ao nosso favor, nós é que muitas vezes não percebemos os avisos que surgem a todo o tempo estampados à nossa frente e não conseguimos enxergar porque, na maioria das vezes, estamos tão preocupados com nós mesmos que não podemos perceber que, a solução daquele problema pode estar ao nosso lado, ali no chão, olhando para você e que por ironia do destino, quando você pensa que ajudou aquela pessoa, na verdade você está ajudando muito mais a você mesmo.


Sidney Paternoster Esteves

Rio, 05/2001

domingo, 18 de janeiro de 2009

Histórias do Casarão (NATAL)



É inevitável, sempre que chega esta época de Natal, recordo-me dos momentos maravilhosos que vivi no casarão.

A começar pela decoração, a montagem da árvore que normalmente era feita pelos meus pais.

O difícil era chegarem a um acordo nos enfeites, o que colocar, como colocar as luzes enfim, prevalecia quase sempre à vontade do meu Pai, mas minha Mãe não se importava, acho até que se sentia muito feliz porque no final, sempre ficava bonita.

Todo aquele movimento na preparação da ceia, discutindo idéias, opiniões sobre o que fazer, como fazer, o que servir primeiro, a distribuição dos presentes que sempre era na véspera, porque ninguém aguentava esperar o dia.
Chegava um dava os presentes e os outros acabavam fazendo a mesma coisa, era muito legal.

O movimento na cozinha era imbatível, a nossa cozinha era muito grande e comportava muita gente, além de ter uma dispensa que mais parecia um quarto.

A turma ficava “beliscando” uma coisa e outra, muitos risos e historinhas ocorridas nos anos anteriores.

Minha Mãe era só felicidade, os filhos, as noras, netos estavam todos ali, elogiando a comida, agarrando, apertando e beijando, era a glória para ela.

Sempre foi uma grande satisfação para os meus pais verem todos ali reunidos.

Era uma “deliciosa” confusão que até hoje sinto muita falta.

Em um desses natais, na verdade na véspera, resolveram apanhar o baralho e jogar “sueca”, quase sempre jogavam em uma mesa a beira da piscina.

O meu Pai vivia me chamando para jogar e eu sempre evitava aquele jogo, aquilo era um verdadeiro “campo de batalha”, sempre que eu tentava era “detonado”!

Começava todos calmos, sorrindo, daqui a pouco começava a gozação;

O meu irmão Ricardo dizia:

- Eu sou campeão desse jogo!


O meu irmão Maurício, dizia:

- “Cale-te”, ninguém me ganha nesse jogo!


O meu Pai dizia:

- O meu Pai, seu avô, vendeu uma padaria para me ensinar esse jogo!


Falava-se de futebol, do Vasco, era só alegria.

O parceiro do meu Pai neste ano foi o nosso primo Beto, ele era um pouco gago, ainda mais quando ficava nervoso.

A minha irmã desistiu, também ela só era chamada de “burra”!

Isso era só o início, ficava um bebendo cerveja, o outro vinho e “beliscando” alguns aperitivos que mamãe generosamente ia colocando na mesa.

O tempo foi passando e o meu pai perdendo. O Maurício e o Ricardo não perdoavam e começaram a “sacanear” o meu pai por isso. Ele tinha o pescoço duro por causa de uma calcificação, como não podia virar o pescoço para olhar para o lado e falar com as pessoas, precisava levantar um pouco da cadeira e virar o corpo acertando o colarinho da camisa, sabe, ele nunca se deixou abater, não estava nem ai para aquilo e eu o admirava muito pela fibra que ele tinha ...

Pois bem, ele virou e falou :

- Não fo - - não, vocês estão dando sorte !

Virou para o Beto e disse :

- Pô Roberto, você tem que contar as cartas!

O Roberto já nervoso, respondeu:

- Ti ti tio pooo xá xá viii vida, eeeu tô tô cocontannnndo, é que que nãoooo tá tá tá vinnndo nanaaaada!

O Maurício adorava, ria o tempo todo, existia uma certa tensão, o Maurício ficava sacudindo as pernas o tempo todo por debaixo da mesa e o Ricardo torcia o pescoço e levantava levemente a bunda da cadeira e a cada jogada errada do “velho” o Maurício apontava para a mesa e dizia :

- Olha lá, olha lá, á carta que eu queria, obrigado Pai!

Até que ele, Maurício, exagerou e falou!

-Ta muito fácil, assim não jogo mais!

Os dois riram de se acabar e o meu Pai “cuspindo marimbondo” olhou para o Beto ...

- Iiiiiiiii nããããão ooooolha pra pra pra miiiiim nanããããão quê quê euuuuu nanãããão te te tenho cú cú culpa nenhuuuma!

Eu senti que a situação estava crítica, fiquei do lado só observando até que, o meu Pai por causa do nervoso, cometeu um erro e fez uma jogada errada;

E o Beto falou:

- Iiiiiiii tá tá tá veveennndo á á me me merda quê quê tu tu fê fê fez!

O meu irmão Maurício se jogou no chão de tanto rir, o Ricardo não conseguia nem falar até que conseguindo se controlar e “esmerdalhou” tudo falando:

- Acho que o meu avô gastou dinheiro a toa para te ensinar!

O meu Pai jogou as cartas na mesa, saiu se sacudindo todo igual a um boneco, empurrando a camisa para trás, puuuuuto da vida gritando para minha mãe :

- Léa trás os bolinhos de bacalhau!

A minha Mãe lá da cozinha, gritou:

- Pára com isso Walter, que gritaria é essa, você perdeu?

E ele respondeu, vermelho igual a um camarão:

- Não me “aporrinha” não, Léa, faz favor!

Não posso deixar de dizer, eu quase fiz xixi nas calças, caia lágrimas dos meus olhos de tanto rir.

Logo depois chegou a minha Mãe com os bolinhos de bacalhau quentinhos e falou carinhosamente para ele:

- Deixa de ser bobo Walter é brincadeira deles, come esse bolinho, está uma delícia e colocou na boca dele.

Só os maravilhosos bolinhos de bacalhau da minha Mãe para acalmar os ânimos.

À tarde, após almoço, dormia um aqui, outro ali e é claro, o Maurício e/ou o Ricardo sempre arrumavam um jeito de pintar o rosto de alguém enquanto dormia.

Ao entardecer chegava a minha Tia Irene com a minha querida Avó Maria, uma portuguesa daquelas de “bigodinho” com o seu sorriso “gengival”, detestava usar dentadura.

No Natal, ela sempre gostava de beber uma taça de vinho (português) e um cálice de bagaceira portuguesa. Contava que em Portugal, ela é que fazia a bagaceira.

Após a sua morte aos 96 anos, nunca mais conseguimos reunir todos em um mesmo lugar e o Natal nunca mais foi o mesmo.

Na hora da ceia, farta e variada, todos acabavam comendo um pouco mais do que o necessário.

Fazia-se um brinde, com um gostoso “feliz Natal”, sorrisos “abertos”, olhos marejados de felicidade, uma pequena prece, abraços e beijos, promessas de dias melhores, palavras de amor e carinho.

Saía dali com a certeza de que Eu e todos ali, nunca ficaríamos sozinhos.


Sidney Paternoster Esteves
Rio, 17 de Janeiro de 2009