sexta-feira, 13 de março de 2009

Histórias do Cotidiano (Ilha Grande)



Há muito tempo não retornava à Ilha Grande (Angra dos Reis).

A última vez foi com o pessoal da Embratel quando organizaram um passeio de fim-de-semana do qual nunca esqueci...

Pegamos (eu e Mônica, minha linda mulher) a barca em Mangaratiba e ali começou a nossa semana no paraíso!

Logo que avistei a praia de Abraão rodeada pelo verde da mata, com aquelas traineiras, veleiros e pequenos barcos ancorados, o meu coração disparou, ficamos rindo à toa, felizes com a nossa escolha, Ilha Grande, a visão dos deuses!

No desembarque já nos aguardavam a Naira e a Roberta da Pousada “Recanto das Flores”, indicada pelo meu grande amigo Cruz.

Simples, limpíssima e acolhedora, a pousada fica próxima da praia de Abraão e foi uma grande surpresa o carinho com que fomos recebidos a começar pela dona Conceição, mãe de Naira, uma senhora de 82 anos com uma lucidez incrível e um humor contagiante, que nos fez rir muito contando piadas, fatos curiosos de hóspedes estrangeiros e histórias locais.

Não podemos esquecer da cadela Ananda já com 12 anos, só falta falar, e do gato Leleco, albino (usa protetor solar nas orelhas), todos vivendo muito felizes e tranquilos.

Aliás, na ilha os animais são muito sociáveis, esquilos passam perto da gente com amêndoas na boca não estão nem aí para você, os passarinhos, em uma pensão que fomos, iam comer na mesa migalhas de pão e de arroz.

Mas os mais incríveis são mesmo os cachorros. Encontramos alguns na praia de barriga para cima como se estivessem apanhando sol. Toda trilha que nós íamos sempre tinha um nos acompanhando, passavam tranquilos entre o pessoal que caminhava, paravam para dar passagem, só faltavam dar “bom dia” e perguntar como nós estávamos.

Até me fez lembrar quando estive aqui na ilha com o pessoal da Embratel.

Um de nossos amigos, o Serginho. Ele sempre era o último a chegar, mas naquele dia, não apareceu, não me lembro o motivo, ficamos tristes por ele não ter ido.

Aí, em uma de nossas caminhadas pela ilha, um cachorro vira-latas cor caramelo, olhos claros começou a nos acompanhar por todos os cantos até que o Cruz (não podia deixar de ser) com o seu humor inteligente e peculiar, começou a chamar o cãozinho de Serginho, eu só sei que pegou, e ele passou a nos acompanhar nas caminhadas e pasmem: atendia pelo nome “Serginho”. Demos muitas risadas pelo caminho.

As trilhas são fantásticas, o cheiro da mata é indescritível, dependendo do lugar, ou melhor, da trilha que você está, você sente o cheiro mais acentuado do eucalipto ou de frutas como jaca e abricó. A biodiversidade é incrível, vi pássaros; árvores centenárias, como a castanheira com um caule que, para abraçá-la, é preciso uns cinco homens de mãos dadas, com aqueles cipós e raízes imensas se entrelaçando na superfície e atravessando a trilha; plantas; fungos; cogumelos e insetos diferentes do que estou acostumado a ver e em lugares atípicos, como o cacto que vi na pedra com sol escaldante.

Curtimos muito essas trilhas fazendo caminhadas, passamos pelo aqueduto construído em 1893, viajamos de traineira, fomos a Lopez Mendes (considerada, segundo pesquisas, a 3ª praia mais bonita do mundo) porém, a mais emocionante até pelo estado da trilha (havia chovido na noite anterior), foi na Cachoeira da Feiticeira, com a trilha seca dá aproximadamente uma hora de caminhada. Com ela molhada e barrenta, demoramos quase duas horas, escorregava demais, mas ao chegar lá e tomar aquele banho em baixo da cachoeira com aquela água fria, ficamos, como direi, totalmente enfeitiçados pelo lugar e nem lembramos do que passamos para chegar lá.
Tinha um pessoal fazendo "rapel", sinistro, deu vontade de fazer também só que não dava né!

A volta, bem... ninguém é de ferro, voltamos de “táxi boat”, pegamos logo abaixo, na praia da feiticeira. Foram 30 minutos maravilhosos com aquele mar esmeralda e a mata fechada, com as árvores balançando ao sabor do vento, a carícia da brisa em nossos rostos e um sol generoso prateando o mar de pequenas ondas...

Todos os dias à noite saíamos para passear, comer alguma coisa, olhar o artesanato local. Tem uma igrejinha (São Sebastião) na praça que é muito bonita, lembra realmente uma cidade do interior, ela fica aberta ao público para visitação, mas só tem missa uma ou duas vezes na semana e sua decoração é muito bonita. À noite, fica iluminada com uma luz azulada muito adequada para o local.

Uma dessas noites estava chovendo e nós resolvemos ficar na pousada batendo papo com o pessoal e aí tivemos a grata surpresa de conhecer o humor contagiante de dona Conceição. Depois de algumas piadas ela nos contou uma história de um nativo.

Na época do presídio, várias pessoas que viviam na ilha vendiam suas plantações de legumes e hortaliças (infelizmente hoje é proibido esta prática e isso prejudicou muito os nativos, pois acabaram com sua fonte de renda) e prestavam serviço de pedreiro, eletricista e outros para o local.

A partir de um certo mês, o pagamento foi através de cheque e um desses nativos nunca tinha preenchido um cheque antes. Ele, ao perguntar ao caixa do banco como retirava o dinheiro, foi orientado a preencher o valor desejado e ele preencheu no cheque “EU QUERO TUDO”, até hoje o pessoal local zoa ele.

Outro fato curioso foi com um turista alemão. Dona Conceição estava sozinha e ao entrar na recepção da pousada e olhar para o lado, no chalé (cinco metros de distância), notou que o cara estava totalmente nu do lado de fora e de costas para ela, totalmente à vontade, como se aquilo fosse a coisa mais natural do mundo (na Alemanha talvez...) eu me lembro do comentário de dona conceição:

- Eu, quando olhei e vi aquele homem nu de costas para mim, com aquela bunda branca, fiquei sem saber o que fazer, eu não falo alemão!


- E aí dona Conceição, como a senhora resolveu essa situação?


- Eu fiz “psit” e quando ele se virou, nossa senhora!


- O que aconteceu?


- Nada não, eu comecei a mostrar a minha blusa, sacudindo ela, tentando falar com ele para colocar a roupa, mas ele não entendia nada, ficava rindo, achando graça de não sei o que...


- Mas, o que a senhora fez?


- Nessas horas só tem uma saída, peguei a vassoura e balancei para ele!


- E ele?


- Acho que ele entendeu, correu igual um coelho assustado para a toca!


Como foi bom aquele papinho, as piadinhas, o “o que é o que é”, nessa, as duas, mãe e filha, conhecem muitas.

O ruim foi ter que ir embora, deixar tudo aquilo para trás, mas outro dia eu volto para conhecer o outro lado da ilha. O difícil vai ser acompanhar a dona Conceição na caminhada que ela faz junto com a filha todo ano ao redor da ilha, que dura aproximadamente cinco dias (detalhes com o meu amigo Cruz), “caraca”, é inacreditável. Bem, eu vou estar mais preparado, afinal de contas, acreditem, eu estou parando de fumar.

Fumando eu corro 8 km em 30 minutos. Se eu parar de fumar tenho que correr 8 km em 20 minutos pelo menos, caso contrário vou rever tudo... He..He..He.... calma galera... é brincadeira, 25 minutos tá bom!

Sidney Paternoster Esteves.

Maricá, 02/03/2009.

quinta-feira, 12 de março de 2009

Histórias do Cotidiano (Batman)

Sempre achei muito legal acampar. Embora não tenha participado de muitos acampamentos, me encantava ver todas aquelas barracas e trailers. As pessoas conversando animadamente, crianças correndo, bicicletas, paqueras da garotada. Toda aquela cumplicidade para se divertirem, passar um fim de semana com a família, rever os amigos e apreciar a natureza.

No Recreio dos Bandeirantes (Rio de Janeiro), tem um Camping na praia da Macumba. É uma exuberância toda aquela natureza, os animais, como micos, diversas espécies de pássaros e, é claro, aquele “marzão” que mexe com a nossa imaginação. Sem falar dos quiosques para beber uma água de coco após uma caminhada e também uma cervejinha bem gelada.

O meu sogro apreciava muito acampar com a família e sempre foi um cara muito querido nesse lugar.

Há algum tempo atrás, ele estava em sua barraca conversando pelo rádio amador (um hobby na época) e quando acabou de falar, percebeu um menino aparentando quatro anos, de bochechas rosadas e um olhar curioso que se aproximou dele e perguntou:

- Moço, porque o Sr. fica falando ai nesse negócio o tempo todo?

Ele, que sempre gostou muito de crianças, resolveu brincar com o menino e iniciou uma conversa:

- Olha, eu vou te contar um segredo que você não pode contar para ninguém, você promete não contar?

- Prometo (ele encostou na boca os dois dedinhos indicadores cruzados e beijou).

- Bem, se é assim eu vou te contar... Eu sou o BATMAN!

- Você é o BATMAN?!

Ele ficou na ponta dos pés com as mãozinhas no rosto, os olhos esbugalhados, com aquela expressão de surpresa e ao mesmo tempo de alegria.

Continuou conversando com o menino:


- Psiu, fala baixo, ninguém pode saber, é um segredo, lembra?


Ele se aproximou do meu sogro e falou baixinho no ouvido dele:

- Tá bom... Cadê o Robin?

- O Robin não está aqui, você vai ficar no lugar dele, mas não fala para ninguém!

E assim o menino passou grande parte do dia de um lado para o outro da barraca falando com o meu sogro, olhar maroto e com aquele sorriso de cumplicidade, o pessoal ria muito de tudo aquilo. Na época a dupla (Batman e Robin) era muito popular e as crianças adoravam.

No dia seguinte na praia, estávamos conversando sentados na areia quando o menino se aproximou com um picolé na mão e o rostinho cheio de lágrimas dizendo para o meu sogro:

- BATMAN, dá uma “lambidinha” no meu picolé que o meu pai não quis comprar um para você!

Ele fazia “beicinho”, segurava o picolé com uma das mãos e a outra enxugava as lágrimas.

A inocência daquele menino, a decepção de não poder dar para o amigo Batman um picolé, “caraca” deu até vontade de chorar com ele.

O sogrão abaixou, com os olhos marejados, abraçou o menino e disse:

- Não chore, foi bom você não trazer o picolé. Eu estou gripado!

Logo sumiram as lágrimas e ele sorriu abraçando o meu sogro dizendo:

- A gente compra outro picolé amanhã, tá bom?!

É para derrubar qualquer um. Que situação... Não dava naquele momento para acabar a brincadeira e dizer que ele não era o Batman.

Só que não podíamos imaginar que essa pequena brincadeira chegaria a uma situação ainda mais constrangedora.

Ao anoitecer, o menino entrou correndo em nossa barraca chorando e gritando:

- BATMAN… BATMAN ... vai lá na nossa barraca que o meu pai está batendo na minha mãe!

Situação pior ainda. Não dava para se meter em briga de casal e o sogrão saiu com uma muito boa:

- Eu não posso ir lá porque se eu colocar a roupa do BATMAN todo mundo vai descobrir, mas eu tenho aquele amigo ali, o Sr. Mauricio (Gerente do Camping). Fala com ele, que ele vai lá resolver.

Lá foi ele, meu sogro acenou para o Maurício e fez um gesto para que ele ouvisse o menino.

Felizmente tudo foi resolvido pelo gerente do Camping, mas ficou uma lição, quando você brincar com uma criança não a subestime, pense no que você vai dizer para ela. A imaginação delas pode te surpreender.

Uma coisa é certa, o meu sogro não quer ouvir falar nem de longe a palavra BATMAN...também né?!

Sidney Paternoster Esteves

25/02/09